segunda-feira, dezembro 17, 2007

o Diário de Bordo do MEU Retiro :)

14 de Dezembro
17:40, Guarda
Sentada num cafézinho na praça da Sé

Estou espantada com o movimento desta cidade. O centro histórico está cheio de gente. Muitos jovens, crianças e adultos. As pessoas parecem ignorar o frio.
Estou a espera para entrar na Sé, linda de morrer, século XIV, XVI. :) Já fiquei a saber que o senhor que costuma abrir as portas está de férias, mas como há missa às 18h, alguém a terá de abrir. Está muito frio, um ar gelado que me congela o nariz!
A cidade tem uma dinâmica interessante. Há muitos adolescentes que andam meios bebados aos berros, aos berros, em grupinhos, com as hormonas à flor da pele. Os casalinhos que não são poucos agarram-se pelos cantos, que também não são poucos, da malha medieval.
Vi um cãozinho muito mal tratado que teve medo de mim, mas que acabou por me permitir algumas festinhas.
A arquitectura é assustadora. Parece-me a mim que não existe uma consciencia patrimonial. Quando subia o morro da Torre de Menagem assustei-me muito ao entender que estava em construção um trambolho mesmo em frente à torre. Encontrei também aí uns casalitos de tenra idade escondidos nos socalcos da subida para a torre, que estava fechada, mas que se podia ler na soleira 1000 e tal metros de altitude! A paisagem era magnifica. Os casais fingiam olhá-la assim que davam pela minha presença.
Quando confrontei a senhora do posto de turismo acerca do trambolho em frente à torre de menagem, esta indignada disse que era uma obra de reabilitação do existente com um edificio de apoio a esta. Achei que não valia a pena discutir!
A estação de combóio fica no fundinho da montanha. Lembrei das minhas aulas de urbanismo assim que subia a pé a montanha de mochilíssima às costas... Repetia para mim mesma que obviamente a estação não poderia ficar mais acima e que por esta se situar naquele ponto a cidade crescera exactamente naquela direcção.
As pessoas são muito simpáticas, mas sinto uma certa desconfiança assim que me vêem sozinha de mapa na mão.
Tenho ainda algumas dúvidas:
- Num extremo da extensa judiaria existe um "Largo do Torreão", "Rua do Torreão", etc. mas por mais voltas que desse não encontrei torreão nenhum;
- Em frente à Sé existe um bar com musica altissima, cheia de miudos com pseudo-fardas à porta... será que fechará as portas quando a missa começar?

15 de Dezembro
22: 47 Penhas da Saude
Pousada (alpina fantasma) da Juventude

O dia foi longo! Depois de uma valente queda no centro da Guarda a caminho da paragem de autocarro (porque havia uma extensa camada de gelo no chão:S) e depois de uma hora e tal a espera do transporte, parti para a Covilhã!
A linha entre as duas cidades é realmente LINDA. Assim que cheguei entendi que seria outro filme para conseguir chegar ao centro. Desta vez seria um filme ainda maior, uma vez que autocarros, nem vê-los! Taxis, idem...
Apanhei uma boleia do primo do dono do bar da estação, um velhinho muito simpático. O senhor deixou-me em frente à camara onde existe a única praça de taxis da cidade! Explicou-me onde começava o centro histórico e onde ficava o posto de turismo. Ficou muito indignado quando lhe disse que receava apanhar mais frio aqui que na Guarda. Respondeu-me logo: "Menina, a Guarda é a cidade mais alta de Portugal!" (com uma pronunciazinha que fica entre o alentejano e o açoreano... ) E foi assim que aprendi algo já esquecido das minhas úteis aulas de geografia.
A cidade é muito bonita, porém achei-a um pouco deserta, pelo menos em comparação com a da Guarda. Uma população claramente envelhecida e um meio bem mais pobre. As pessoas pareceram-me um bocado apreensivas com a minha presença, não sei se por se sentirem invadidas ou desconfiadas. Uma altura sentei-me num banco em frente à Igreja Matriz- muito bonita, com a fachada revestida a azulejo branco e azul. Luminosa, naquele fim de tarde- e uns senhores pararam a observar-me, como que a pensar o que estava eu ali a fazer.
Observei uma ausência de toponímia, o que me levou a perder varias vezes... Os espaços públicos pareceram-me bem mais arranjados que os edifícios. Quaisquer 5 ou 6 m2 de espaço livre servia logo para colocar um banquinho, uma árvore, um bebedouro. Eu usofrui ao maximo desses espaços, no entanto parecia a única a dar-lhes uso.
Assim que o sol se pôs, quis recolher, já que ainda ia subir a serra de taxi. O senhor da boleia tinha-me dito, ao subir a colina, que a pousada da juventude não se conseguia ver, que ficava já do outro lado da montanha. Fiquei chocada.
A viagem de taxi foi pacífica e cara! Muito bonita também, com uma coloração rosada no céu, ainda do pôr do sol, nas minhas costas.
A pousada revelou-se uma surpresa, assim como a povoação das Penhas da Saúde! Sim, porque ao contrário do que eu pensava existe uma povoação! É toda alpina, com pedra e madeirinhas por todo o lado. Fiquei impressionada com os cheiros a fumo e petróleo, das lareiras e aquecimento. Mais impressionada ainda fiquei com o piso inferior. Segui a indicação da sala de convívio e deparei-me com um espaço enorme, com paredes de pedra, suturno e enigmático. Há uns meses atrás sonhei com aquele sitio. Acreditem ou não, sonhei!
Ah, questões do dia:
- Segundo um desdobrável sobre a cidade da Covilhã:
- O seu núcleo urbano estende-se entre os 450 e os 800 m de altitude!
- Hoje a Covilhã é "uma cosmopolita cidade universitária"!! LOL

Bem, e agora vou dormir na minha camarata para 8 pessoas, sozinha!! :D

16 de Dezembro
16:00 (em ponto), Pampilhosa
Café Tai Tai (medo)

Antes de mais, esta gente tem problemas com os nomes dos cafés... Tai Tai, Tip Top e Café Angola!
Já aqui estou há uma hora, e ainda me falta uma hora e meia pelo combóio certo...
Esta manhã apanhei boleia da cozinheira da pousada, uma senhora com claros problemas hormonais, muito gorda e máscula! O marido, um senhor pequenino e magricelas. Foi de rir. Sempre que o homem dava uma opinião qualquer dizia: " Nozz temozz que intenderi que a zituazão que ze pazza é a zeguinti..." e a mulher berrava: " Cala-ti Zééé! Não fales do que não sabiiis!! Conduz mas ei, homeeeem!!!". De rir! Houve momentos em que receei que ela lhe batesse. Deixava-o K.O facilmente.
Foram ambos muito amáveis! Apeteceu-me dar-lhes um abraço na despedida, mas o senhor cheirava muito a suor e a senhora... bem os pelos enormes que tinha na sua cara obesa tiraram-me completamente a vontade.
A viagem de volta a Guarda foi gélida. Meio dia e 4ºC e com o aquecimento do combóio avariado! Nas viagens li o Segredo e aconselho-o a todos. É tal e qual o filme mas o livro pareceu-me mais profundo. Aproveitei a beleza da paisagem para meditar um bocadinho, como não fazia há anos.
Considero-me não urbana, mas urbanizada e muito facilmente ruralizável. Cresci com as vindimas, as desfolhadas, o gado, a roupa lavada no tanque com cheirinho a sabão rosa, com a tenebrosa matança do porco... Sinto que por vezes necessitamos regressar às origens para nos conhecermos melhor.
Assim que apanhar este combóio a aventura encerra-se. Vou ter saudades de dias tão longos e tão meus.

Ah, algumas questões existenciais:
- A Guarda é uma cidade muito a frente! A missa das 18h decorreu na Sé ao som da musica histérica do bar em frente.
- Em 3 dias tão diversos e agitados não encontrei nem uma pessoa desagradável!:)
- Banda sonora: Nouvelle Vague
- A D. Isabel e o Sr. Zé vieram ao Porto uma única vez e por engano! Ehehe São os maiores!:)
- Mil obrigados à Ticha :D